por Me. Osvaldo Pinheiro da Silva

A pesquisa é apresentada em forma de Cadernos onde se propõe relatar, em três momentos, as experiências vividas durante todo esse trajeto.
O conteúdo está disponibilizado como “Cadernos Pedagógicos” e foi organizado a partir de investigações teóricas e de campo. Teremos registros de mediações feitas durante o estudo, incluindo esboços, descrições e comentários para esclarecer notas. É um trabalho de registro de todas as atividades realizadas, inspiradas em frases, músicas, filmes, documentários, leituras, conversas, entrevistas e livros com suas respectivas menções de origem.
A cada Caderno, busco responder a muitas inquietações durante todo o percurso, tais como: “O que e como essas 3 (três) experiências me afetaram? O que fizeram comigo? O que contribuem para uma pedagogia contracolonial? O que fazem para o mundo da educação, do teatro, da arte, etc.? E o que esse percurso de mestrado me ajudou como experiência de vida?
O Primeiro Caderno intitulado “O Autor como Narrador”, diz respeito às experiências vividas e observadas no Acampamento “Luta Pela Vida” (conforme imagens 01), em Brasília, quando tive a oportunidade de conviver com lideranças e movimentos indígenas de diversas partes do país, participar momentaneamente de suas realidades e ritos, e me reorganizar quanto aquilo que os reducionismos me fizeram entender sobre o ser “índio”, numa América Latina diversa e desde sempre plural, que carrega tintas e cores muito específicas de cada povo e reivindica cosmovisões particulares em suas vivências.

Fonte: arquivos pessoais
Sendo assim, esse deslocamento me fez refazer todo o trajeto daquilo que internamente era incômodo e me possibilitou dar uma guinada nas subjetividades que me habitam. Nesta busca, uma imagem (imagem 02) me chama atenção na qual continha muitos nomes dos povos originários, trazendo a dualidade na demarcação escrita e simbólica, assim como o protesto de demarcação de terras indígenas.

Fonte: arquivos pessoais
O Segundo Caderno intitulado “Professoras(es)”, está organizado como formação com docentes, a partir da Lei 11.645/08, e o compartilhamento das flechadas ao vento que refizeram boa parte do meu percurso na Arte Educação, desta feita, um tanto mais consciente da busca constante por uma educação contracolonial que reverberasse para além de mim, mas também com demais docentes do contexto escolar de trabalho cotidiano.
Foi um momento que nos oportunizou estreitar uma relação profunda de estudo e entendimento sobre questões diversas, a partir de culturas indígenas brasileiras, efetivar propostas e visibilizar essa área do conhecimento, na maioria das vezes criminalizada ou apresentada num modelo que só reproduz preconceitos, estigmas e exclusões ligadas a práticas subalternizadas.
Este momento da pesquisa nos possibilitou recontar histórias dessas culturas e também incentivar leituras decoloniais, conforme aponta Catherine Walsh apud OLIVEIRA & CANDAU (2010, p. 24):
[…] a decolonialidade implica partir da desumanização e considerar as lutas dos povos historicamente subalternizados pela existência, para a construção de outros modos de viver, de poder e de saber. […] é visibilizar as lutas contra a colonialidade a partir das pessoas, das suas práticas sociais, epistêmicas e políticas. A decolonialidade representa uma estratégia que vai além da transformação, da descolonização, ou seja, supõe também construção e criação. Sua meta é a reconstrução radical do ser, do poder e do saber.
E, seguindo rastros sobre a visibilidade dessas lutas, foi elaborado um plano de aprendizagem dividido em 5 encontros sistematizados da seguinte forma: 1º ENCONTRO – “Lei 11.645/08: Pindorama (Terra das Palmeiras) – Kaê Guajajara e Território Ancestral”; 2º ENCONTRO – Desconstrução – Entrevistas com lideranças indígenas. O recorte dessa transcrição foi: Como se dá a Educação na Aldeia? Entrevistados: Cacique Chicão Terena (Edenilson Sebastião), Chirley Pankará (Chirley Maria de Souza Almeida Santos), Valdir de Souza, Budga Deroby Nhambiquara, Eldo Shanenawa (Eldo Carlos Gomes Shanenawa), Olívio Jekupé, Mirna Kambeba Anaquiri (Mirna Kambeba Omágua Yelê), Joedson Nascimento (Francisco Joedson da Silva Nascimento), Ingrid Sateré Mawé (Ingrid Silva de Assis Leitemberg) e Ismael Krahô (Ismael Ahprac Krahô);
No 3º Encontro de formação de professoras(es), falamos sobre Ancestralidades a partir da provocação dos rastros ancestrais que nos habitam; no 4º Encontro realizamos uma prosa de reflexão a partir dos vídeos: “Ecologia”, “Pajerama” e “Brincar de Índio – Xou da Xuxa”, intitulado: Audiovisual – Ecologia de Saberes.
Finalmente, no 5º encontro foi apresentado “Dados e Estatísticas – Contrapondo reducionismos”, sobre as realidades e luta indígena, encerrando com as reverberações e resultados dos encontros sugeridos e as devolutivas, a partir dos materiais devolvidos pelos docentes sobre as sequências pedagógicas e/ou tarefas formativas solicitadas.
No Terceiro e último Caderno, intitulado “Estudantes”, foi elaborado o projeto: “O Teatro e Os Povos Originários” como proposição de des-caravelização de mentes. Teve como objetivo apresentar aspectos relevantes ligados à diversidade das culturas indígenas, a partir do acervo de obras sobre literatura indígena disponível na sala de leitura da EMEF Profª Célia Regina Andery Braga, no contexto do Ensino Fundamental. O trabalho foi pensado para ser um espaço de expressão que se propusesse a apresentar criticamente rastros de sociabilidade, utilizando-se de diversos fundamentos, linguagens e jogos teatrais como forma de ampliar repertórios.
Nesse processo, realizamos investigações cênicas que puderam facilitar modos de perceber, sentir e articular significados, valorizando os diferentes tipos de relações entre pessoas numa sociedade. Buscamos, também, fazer com que docentes e discentes pudessem perceber que suas vivências estão enraizadas na cultura indígena, mesmo sem saber, numa “revisão” da construção cultural da imagem do “índio”, por meio da apresentação dessas culturas, desde os processos da colonização portuguesa até a era contemporânea.
Foi um percurso que nos possibilitou criar espaços de troca, tendo como fio condutor o teatro e aspectos amplos da arte imergindo do caos, das encruzilhadas, como semente de mundos diferentes, semente de mundos possíveis, dos mundos que queremos e podemos construir.
Os encontros foram desenvolvidos de forma a sistematizar atividades, dinâmicas e práticas na escola, tanto em sala de aula quanto nos demais espaços, quebrando estigmas de que o processo de ensino e aprendizagem se faz apenas em sala, mas também em ambientes ao ar livre (referendando o modo de ensinar dos povos originários), usando ainda as salas de vídeo e leitura, brinquedoteca, corredores, jardins, quadra e demais espaços externos da unidade escolar. O projeto teve como resultado a encenação do exercício: “Antes do Brasil da Coroa, existe o Brasil do Cocar”, parafraseando a fala da liderança indígena Célia Xakriabá.

Fonte: arquivos pessoais
Sendo assim, este momento buscou contribuir para a ampliação das bases teóricas e metodológicas da arte-educação, por meio dessa pesquisa que teve como objetivo reconstruir imaginários e garantir a aplicação da Lei 11.645/2008, estabelecendo a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura afro-brasileira e indígena, ampliando o debate sobre direitos e acessos das políticas educacionais.